Durou pouco mais de duas horas a tempestade que desabou sobre o Rio de Janeiro, na última noite de quarta-feira (06/02/19). Ventos a 100 km por hora e chuvas torrenciais derrubaram postes de eletricidade deixando diversos pontos da cidade às escuras. Como se tivessem sido arrancadas pela mão de um gigante enfurecido, árvores que aparentavam robustez expunham na manhã seguinte raízes desnudadas. A chuva arrastou carros largando-os submersos a metros de distância. Toneladas de lixo foram jogadas nas ruas e nas praias. A lama deslizou pelas encostas, soterrando casas e um ônibus. Sete pessoas morreram.
Ao acompanhar as notícias da tragédia foi impossível não lembrar de Donana e Titonho, personagens do livro de Ninfa Parreiras, ilustrado por André Neves.
De forma poética, a autora narra a história de um casal de catadores de lixo que construiu uma vida sem alicerces e sonhos pequeninos.
Tonho conheceu Nana
Entre escombros
Duma casa caída
O moço cavava a terra
A moça desenrolava fios
Juntos montaram um canto.
Com peças que descobriam.
Casaram e se mudaram
Cataram e juntaram os dias.
Era noite escura quando a chuva traiçoeira os pegou de surpresa.
Com a enxurrada que escorria
Descia lama
Água barrenta
Tramas
Trincas
Trancos
Pedra
Tronco
Parafuso
Donana e Titonho perderam o pouco que tinham, assim como famílias de carne e osso que moravam no alto da Rocinha.
Fechei o livro com o coração aflito. Como era possível ter gostado tanto de uma história tão triste? Seria tão bom se ela não precisasse ser contada!
Felizmente Ninfa Parreiras não está anestesiada para o sofrimento alheio. Seu Donana e Titonho é um brado contra a indiferença, que transforma vidas humanas em números. Estatísticas fatais que poderiam ser evitadas. Basta de tanta omissão e descaso!
- Donana e Titonho
Ninfa Parreiras e André Neves
Editora Paulinas
R$ 32,50